O Tribunal da Relação de Lisboa, em Outubro de 2016, contrariando a decisão do Tribunal de Primeira Instância, veio dar razão à Assembleia de Condóminos que deliberou a proibição do condómino da prática de alojamento local. A alínea c) do número 2 do artigo 1422.º do Código Civil esclarece que é especialmente vedado aos condóminos dar à sua fracção autónoma “uso diverso do fim a que é destinada”. O Tribunal da Relação de Lisboa considerou neste Acórdão que se um condómino dá à sua fracção um uso diverso do fim a que, segundo o título constitutivo da propriedade horizontal, ela é destinada, infringe a lei. Considerou o Tribunal que se a fracção autónoma se destina, segundo o título constitutivo, a habitação, não lhe poderá ser dado outro destino (alojamento mobilado para turistas) tendo considerado irrelevante o licenciamento do local para a respectiva actividade comercial. Acrescenta o Tribunal na sua fundamentação que as autorizações emitidas pelas entidades administrativas competentes, segundo as quais determinada fracção autónoma de prédio constituído em propriedade horizontal pode ser destinada a comércio, não altera o estatuto da propriedade horizontal constante do respectivo título constitutivo, segundo o qual essa fracção se destina a habitação.
Este Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa vem contrariar o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto (Setembro de 2016) que, a propósito de um caso semelhante, deu razão ao proprietário da fracção autónoma considerando que o conceito de alojamento está contido no conceito de habitação e, como tal, se no título constitutivo da propriedade horizontal apenas se estabelece que determinada fracção se destina à habitação, não existem em princípio, impedimento a que o seu proprietário a afecte a alojamento local a turistas. Mais, entende este Tribunal que o Regulamento do Condomínio não pode, a pretexto de regular a utilização do imóvel, impor restricções materiais ao conteúdo do direito de propriedade de cada condómino sobre a sua fracção que não resultem do título de constituição da propriedade horizontal ou a que o condomínio tenha dado o seu consentimento.
As questões essenciais, cujo esclarecimento é urgente, são as seguintes:
- Deve o alojamento local ser considerado um uso diverso do fim a que se destina uma fracção autónoma que se destine única e exclusivamente a habitação (e não ao exercício de actividade comercial) e consequentemente ser possível à Assembleia de Condóminos opor-se a tal utilização?
- E deve a proibição de utilização de uma fracção como alojamento local ser considerada como atentatória do direito de propriedade do proprietário da fracção e por isso uma limitação desadequada e desproporcional dos seus direitos?
Como contrabalançar e equilibrar estes interesses e articular estes direitos?
Importa no entanto esclarecer que nenhum dos Acórdãos dos Tribunais da Relação acima referidos transitou em julgado, tendo ambos sido objecto de recurso para o Supremo Tribunal. Quer isto significar que nenhuma das decisões é ainda definitiva e que, mesmo após Acórdão do Supremo Tribunal sobre cada um dos processos, a orientação deste Tribunal superior será somente aplicável a cada caso concreto, não se podendo, em princípio, considerar aplicável a qualquer outro caso. Por isso a incerteza deverá ainda permanecer durante algum tempo, existindo neste campo uma indesejável incerteza jurídica…
Assim sendo e tendo em consideração a incerteza no que se refere a este assunto, será essencial que qualquer pessoa que pretenda dedicar os seus imóveis ao alojamento local, se encontre munido de acompanhamento e aconselhamento adequado, por parte de profissionais competentes e experimentados no tema, para salvaguardar o investimento e o sucesso do seu plano de investimento.